Processos
Criativos
com Exposição
Esta
ação educativa promovida pela
Contempoarte tem por objetivo, oferecer aos seus
participantes a oportunidade de conhecer de perto
os processos criativos de diversos artistas contemporâneos.
Ao mesmo tempo, visa analisar e orientar as criações
dos artistas participantes nas suas diversas
linguagens, fornecendo adensamento conceitual
e crítico sobre as obras apresentadas.
Este
projeto de Orientação de Processos Criativos
tem duração de seis meses e, o resultado dessa
proposta é mostrado em uma exposição.
Orientação e Curadoria: Waldo Bravo.
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Textos
de apresentação
Exposições Individuais
Teias & Tramas
A
artista Regina Helene utiliza um processo criativo em que incorpora
o múltiplo, o heterogêneo. É uma
expansão da escultura ao tratar de volumes flexíveis
aglutinados, da costura informal, das linhas e rendas gráficas
intuitivas e da adição de múltiplos materiais
na sua estrutura-base.
As técnicas utilizadas pela artista têm por base
a aglutinação mediante a assemblage, a tridimensionalidade
e o objeto e, através dela, a artista alcança uma
rica diversidade de forma, cor e volume, criando um vocabulário
de impacto visual.
Na obra de Regina, a desconstrução da matéria é um
elemento estrutural predominante, é seu território
simbólico, no qual ela manifesta toda a sua personalidade.
Essas linhas e cordões dialogam com os volumes, com os
preenchimentos e com os espaços cromáticos, outorgando
a esses elementos que compõem a obra pesos e valores visuais
diferenciados, conseguindo um resultado livre e corajoso, fruto
dessa harmonia de excessos.
São esses cordões emaranhadas de teor orgânico
e selvagem que modificam a percepção da assemblage
saturada da artista, os quais conduzem nosso olhar pelos volumes
e aglutinações, inserindo profundidade na obra
e aumentando a força dos seus campos cromáticos.
A liberdade e a complexidade das suas criações
dão início à formulação das
próprias teorias visuais da artista, levando-nos a um
imaginário singular de obras expressivas que retém
o nosso olhar.
Embora vejamos uma aparente ambiguidade entre o território
emocional e o racional, plasticamente o que acaba prevalecendo
de modo geral no campo da representação são
as composições abstratas, líricas e emotivas,
nas quais os procedimentos híbridos estão ganhando
espaço e corpo na atualidade.
As obras de Regina são selvagens ao extremo e, ao mesmo
tempo, aconchegantes, e é justamente essa característica
que torna sua obra atraente ao nosso olhar.
Waldo Bravo
Artista-curador e Arte-educador
A maciez das Cores
O experimentalismo poético tem levado Helena Falconi
a transitar por diversas linguagens, numa relação
livre de múltiplas possibilidades estéticas.
As obras atuais são o resultado de uma longa relação
da artista com a pintura. São produções
expressivas, vibrantes, vigorosas e repletas de sensualidade
cromática.
A técnica da Feltragem adicionou materialidade, volume,
maciez e aconchego às suas criações. A lã de
carneiro foi incorporada no seu processo criativo com maestria.
Na superfície da sua obra acontece um lindo diálogo
entre cores, tonalidades e plasticidade cromática.
Quem acompanha o percurso da artista se surpreende com o vigor
das suas novas obras e com a abrangência de sua narrativa
poética no campo da abstração concreta.
A cor sempre esteve no centro das suas pesquisas e cada vez mais,
adquire valor e importância. Mas as obras de Helena vão
muito além das relações cromáticas
e construtivas. Helena cria um território sensível,
repleto de planos, profundidade, luz e sombra. Constrói
tensões cromáticas e territoriais entre os espaços,
fator determinante no valor expressivo entre as cores, definidas
na sua relação lado a lado.
Suas indagações estéticas resultam da incorporação
de experiências distintas na estrutura interna da sua linguagem.
Nesse território bidimensional, a artista se expressa
com personalidade, revelando seu domínio da técnica
e propostas artísticas.
Suas obras permitem variadas leituras no vocabulário artístico
e, ao mesmo tempo, promovem uma ampliação de sentidos
e significados em torno das propostas autorais.
Helena revela rica experiência vivencial representada em
trabalhos equilibrados e sem excessos, desenvolvidos e lapidados
ao longo de sua sensível trajetória de vida e arte.
Waldo Bravo
Artista-curador e Orientador
Poéticas de Resiliência A resiliência é a capacidade para lidar com problemas,
adaptar-se a mudanças, superar obstáculos ou resistir à pressão
de situações adversas. Resiliência é sinônimo
de vida e arte na trajetória de Edith Popluhar. A sua
obra menciona poeticamente a sua passagem pela medicina e pela
arte terapia. Na década de 80, após algumas importantes
perdas familiares a artista entrou em depressão e, mergulhando
na arte, superou desafios para alcançar seu equilíbrio
interior.
Tratamentos de doenças e medicamentos que outrora fizeram
parte do seu dia-a-dia, como médica, agora são
matéria prima para as poéticas visuais de suas
obras. Observando a história da arte podemos constatar
que as melhores obras contemporâneas trazem consigo, incorporada,
uma boa carga de autobiografia.
De modo geral, as embalagens de medicamentos, após seu
uso, são descartadas. As obras de Edith mostram duas questões:
de um lado a consciência ecológica e, de outro,
as apropriações “duchampianas” que
estão presentes na produção da artista ao
transformar caixas de remédios, recontextualizando e ressignificando
esse material no território da arte. Essas embalagens
farmacêuticas são dispostas e agrupadas sequencialmente
para construir uma linguagem artística concreta e, ao
mesmo tempo, minimalista onde podemos observar um enorme poder
de síntese. Trata-se de um procedimento obsessivo e sistemático
que dá origem a singulares composições e
texturas de grande expressividade. A utilização
de embalagens farmacêuticas no processo criativo não é algo
novo, estando presentes nas obras de outros artistas contemporâneos,
como Damien Hirst.
Obras desta mostra já estiveram presentes em dezenas de
exposições e renderam importantes prêmios
para a artista, dentre eles: 1º Lugar no VIII Prêmio
Arthur Bispo do Rosário em 2018, 1º Lugar na 44ª Anual
da FAAP em 2012, 1º Lugar em Pintura e 3º Lugar em
Escultura no VI Prêmio Arthur Bispo do Rosário em
2011, Medalha de Ouro no XXXIII Salão Contemporâneo
de Franca em 2009.
Seus trabalhos abordam questões existenciais, vida e morte.
Os medicamentos têm como objetivo curar, salvar e prolongar
vidas. Nessas obras, são as próprias embalagens
de remédios que são imortalizadas mediante a arte.
São obras que apresentam uma boa dose de mistério.
Obras que nascem restritas ao pensamento autoral e, a partir
do contato com o público, seus sentidos e significados
são ampliados e multiplicados mediante novas visões
e leituras do espectador.
Estamos diante de uma trajetória de sólida raiz
iconográfica que modificou e ressignificou a vida da artista.
Waldo Bravo
Artista-curador e Orientador
Pintura Orgânica
Na sua primeira exposição individual, a artista
Amalia Lisboa apresenta pinturas de teor orgânico, onde
se destaca a relação figura e fundo dos diferentes
campos pictóricos.
Suas obras são constituídas por territórios
coloridos, planos e sensações de profundidade,
criados a partir das transparências cromáticas.
São manchas expressivas de grande fluidez, às
vezes de forma nítida, e outras vezes semi-encobertas
por outras camadas de tinta, num provocativo jogo de apagamento
e sedução construído a partir dessas sobreposições.
Seu processo criativo incorpora a acomodação
espontânea dos pigmentos líquidos, por nivelação
horizontal na superfície da tela.
A artista constrói tensões cromáticas
e territoriais entre os espaços saturados, em contraponto
aos espaços vazios, o que constitui fator determinante
no valor expressivo das cores e das tonalidades definidas na
sua relação lado a lado.
Amalia brinca com a cor e com o espaço, criando campos
de variados formatos e relações cromáticas,
para alcançar um resultado livre e selvagem.
Mediante manchas vigorosas, exprime na tela suas emoções,
construindo tensões entre espaços ocupados e
espaços vazios.
Um território sensível, repleto de planos, profundidade,
luz e sombra.
São pinturas expressivas, vibrantes, vigorosas e repletas
de sensualidade cromática.
Waldo Bravo
Artista-curador e arte-educador
Elementais da Natureza
Nesta sua primeira exposição individual, Anna
Paes apresenta metáforas visuais da natureza, recriando
a floresta e seus habitantes mediante poéticas visuais
de um imaginário simbólico. Trata-se de recriações
de um universo fantástico repleto de seres mágicos.
Animais e plantas que expressam os gritos da natureza.
Essas obras apresentam uma linguagem híbrida entre
desenhos tribais, o mundo das tatuagens e representações
gráficas contemporâneas.
São desenhos resultantes de traços finos, delicados
e cuidadosos que vão surgindo na superfície
do papel, dando lugar a uma composição informal
e inusitada, em que espaços saturados coexistem harmoniosamente
com grandes espaços vazios. Espaços em que
as repetições dos preenchimentos gráficos
se condensam em territórios construídos em
oposição à delicadeza das linhas submersas
em outros pontos da composição.
Tal qual um refinado bordado, os desenhos da artista são “costurados” silenciosamente
durante o processo criativo.
Na trajetória gráfica de Anna, acontece uma
mudança estrutural da maior complexidade. Momento
esse em que a artista desmembra o desenho em planos e camadas,
adicionando a eles a profundidade. Profundidade que consiste
da transformação do bidimensional em tridimensional,
obtendo nessa passagem de uma dimensão para outra
uma espécie de plenitude espacial.
Seu processo criativo distribui o desenho em diversos planos
e materiais translúcidos para construir camadas leves.
Esse processo recorre a veladuras de “efeito neblina”,
a linhas sutis desfocadas e dissolvidas que suavizam os fragmentos
de desenho submersos nas camadas anteriores.
Ao olhar através dos planos de certas obras e movimentando-se
diante eles, o observador provocará uma interação
visual de um plano com outro desestruturando e reestruturando
o desenho formal ao caminhar.
Desse modo, Anna provoca uma abertura dos sentidos do espectador,
na medida em que condiciona um olhar mais atento de sua parte,
ao mesmo tempo em que põe em evidência uma das
linguagens contemporâneas de grandes possibilidades
experimentais.
Cada obra desta valiosa exposição possui uma
estrutura gráfica única e surpreendente na
apresentação da sua metáfora visual.
Nas suas pesquisas, Anna trilha um caminho muito pessoal,
de grande expressividade e impregnado de unidade estética.
Seguramente, uma demonstração contundente de
qualidade, linearidade e coerência narrativa.
Definitivamente, estamos diante de um vigoroso conjunto de
desenhos contemporâneos de sólida integridade
conceitual e produzidos por uma artista que revela uma fecunda
expressão criativa em sua nítida ascensão.
Waldo
Bravo
Artista-curador e arte-educador
Arte-ludens de
Patricia Kaufmann
Faz parte da natureza humana a ação de brincar, é um
componente instintivo da nossa estrutura interior. Fazemos
isso durante toda nossa vida, desde criança até ficarmos
velhos. A única coisa que muda é o tamanho e
o valor dos brinquedos.
A relação com a contemporaneidade obriga-nos
a atualizar permanentemente nossas brincadeiras.
No território da arte, essa ação de brincar é acima
de tudo uma experiência lúdica mediante a qual
o artista expressa a sua alegria de viver. A arte é o
Playground privado onde os artistas criam para satisfazer seus
delírios e necessidade de diversão.
Para alguns artistas a grande brincadeira é a desconstrução
da realidade para em seguida ter a possibilidade de reconstruí-la
a sua maneira, de forma lúdica. Outros vão além,
resgatam os brinquedos da sua infância e os recontextualizam
poeticamente no presente.
Nesse contexto situa-se o trabalho “Sombra Negra” de
Patricia Kaufmann. A partir de uma atitude “duchampiana” a
artista apropria-se da boneca Barbie e faz dela o objeto dos
seus questionamentos.
Na tentativa poética de humanizar essa boneca, Patricia
coloca-nos frente a um paradoxo visual. A imagem da silhueta
da boneca por um lado oculta os detalhes e por outro lado a
aproxima da condição humana. A artista cria uma
ambiguidade visual para olhares apresados que podem confundir
essa boneca com o corpo de uma mulher verdadeira, outorgando-lhe
a imagem um realismo inexistente e instigante ao mesmo tempo.
Historicamente a representação da figura humana
sempre utilizou o corpo real como referência. Isso não
acontece na obra de Patricia. Precisamos lembrar que a boneca
Barbie já é uma representação estilizada
do corpo feminino, a qual é representada nas fotos de
Patricia, ou seja, conceitualmente temos uma forma de representação
(a fotografia) falando de outra forma de representação
(a boneca Barbie). Ela não está falando do corpo
feminino real.
São imagens inocentes, porém, repletas de sensualidade.
Imagens poderosas na imaginação fértil
do espectador que o fazem mergulhar no jogo de sedução.
Este ícone que marcou toda uma geração
de meninas é um brinquedo aberto às transformações,
projeções e desejos particulares das suas donas. É como
um “avatar”, um outro corpo emprestado para você usar
em uma vida paralela onde a palavra de ordem é a diversão.
No processo criativo da arte atual o que realmente importa,
não é O QUE o artista faz, e sim, O COMO ele
faz. Patricia criar brincando e ao mesmo tempo brinca trabalhando.
Waldo
Bravo
Artista-curador e arte-educador
30ª Bienal de São Paulo
Com o nome de “A Iminência das Poéticas”,
a 30ª Bienal de São Paulo apresenta quase três
mil obras de 111 artistas do Brasil e do mundo.
A principal mostra de arte contemporânea do nosso continente
se apresenta renovada e consistente. O curador venezuelano
Luis Pérez-Oramas deixa claro que é possível
fazer um bom trabalho, mesmo enfrentando adversidades.
A princípio, o objetivo da bienal é apresentar
um amplo panorama da produção da arte atual
no mundo. Essa produção é cada vez mais
ampla e diversificada devido a derrubada das fronteiras entre
os diversos territórios da cultura.
Embora saibamos que existem alguns territórios experimentais
mais generosos e outros mais pobres e esgotados (como a pintura),
alguns curadores optam por caminhos fáceis e tendenciosos,
deixando-se levar pelas fartas produções.
É
sempre um desafio garimpar bons trabalhos em territórios
esgotados, contudo, tem suas recompensas. O curador Pérez-Oramas,
consciente dessa questão, foi capaz de montar uma
Bienal ampla e diversificada.
O aspecto mais interessante dessa edição é o
fato de apresentar artistas e obras inéditas na sua
maioria (cerca de 75%) que, na montagem, foram agrupadas
por analogias de linguagens e temas. Há poucos artistas
conhecidos pelo público. Essa diminuição
de estrelas não afasta os visitantes, afirma o curador
Pérez-Oramas.
Nessa edição, o público poderá ver
uma importante retrospectiva individual com 348 peças
do artista brasileiro Arthur Bispo do Rosário (1909
-1989), considerado pelo curador como um artista emblemático.
A Bienal traz uma novidade ao ocupar também diversos
espaços da cidade, tais como a Capela do Morumbi e
a Casa Modernista na Vila Mariana, extrapolando dessa forma
os limites do parque Ibirapuera. Faz parte desse grupo o
artista argentino Leandro Tartaglia, a americana Maryanne
Amacher, a dupla Sergei Tcherepnin e Ei Arakawa, entre outros,
que apresentam obras conceituais mediante intervenções
sonoras.
Trata-se de uma Bienal correta e sem excessos, que apresenta
um instigante e provocativo panorama da arte atual. Uma Bienal
que resgata o prazer na convivência com a arte e, ao
mesmo tempo, resgata seu prestígio com dignidade,
posicionando-se como um dos eventos de arte contemporânea
mais importantes do mundo.
A megaexposição montada nos 25 mil m² do
pavilhão projetado por Oscar Niemeyer, no Parque do
Ibirapuera, tem este ano um orçamento de R$ 22,4 milhões.
A 30ª Bienal de São Paulo abriu suas portas no
dia 7 de setembro e fica em cartaz até o dia 9 de
dezembro.
Waldo
Bravo
Artista-curador e arte-educador
Apropriações
e Aglutinações
de Anita Colli
É
sempre gratificante ver quando uma artista mergulha de coração
aberto no território experimental das artes à procura
da sua identidade. Com esta experimentação, vem
junto o exercício pleno da liberdade e, ao mesmo tempo,
vem junto a possibilidade de atualizar e sintonizar os processos
criativos autorais com nosso tempo, ou seja, trata-se do exercício
pleno da mais pura contemporaneidade.
Nesse contexto, a artista Anita Colli vive um frutífero
momento. Após passar por diferentes técnicas
e linguagens, a artista alça novos vôos e chega
aos procedimentos que têm como base as apropriações
e as aglutinações. Este processo contínuo
de apropriações e aglutinações
de objetos permeia o processo criativo da artista nos últimos
anos.
Conceitualmente, é importante destacar que a obra de
Anita revela heranças “duchampianas” nessas
construções criativas ao se apropriar de materiais
descartáveis de laboratório para propor novos
modelos estéticos. Esses materiais passam por uma desconstrução
conceitual, procurando um esvaziamento dos seus significados
literais para, em seguida, propor novas possibilidades mediante
uma recontextualização cada vez mais poética,
aberta e experimental.
No aspecto estrutural da obra de Anita também podemos
perceber uma herança construtiva, uma opção
pelo pensamento concreto e racional, com base na aglutinação
de objetos multiplicados. Ao multiplicar a peça, multiplicam-se
também seus sentidos e significados, propondo novas
leituras e novos olhares.
A série dos anelídeos é um dos resultados
do seu interesse pela produção tridimensional.
São obras criadas e produzidas a partir de estruturas
construtivas de fragmentos repetidos e organizados, procurando
fluidez nas suas poéticas visuais.
A série das girolas é composta por estruturas
suspensas, que lembram móbiles interativos. Neste momento,
Anita dialoga no aspecto conceitual e não estético
com Alexander Calder, o pai da arte aleatória conhecido
por seus móbiles fantásticos. As construções
de Anita incorporam movimento, provocado pelo sutil deslocamento
do ar em volta dessas peças. São estruturas leves
que oscilam suavemente.
Na série cirandas, Anita evidencia a questão
participativa por parte do espectador, aproximando-o de sua
obra. São objetos táteis que têm a sua
forma aberta e mutável e, com a manipulação
do espectador, oferecem múltiplas possibilidades e descobertas.
Com esta série de arte participativa, Anita dialoga,
no campo conceitual e não estético, com Lygia
Clark, uma das pioneiras no território da interatividade.
Anita incorpora o aspecto lúdico e interativo nestas
obras ao criar estruturas maleáveis, flexíveis
e cambiantes, frutos de uma mentalidade transformadora e aberta.
Ela questiona a materialidade e a rigidez das suas estruturas
e, ao incorporar linhas transversais com fios flexíveis
interligando esses fragmentos, Anita quebra essa rigidez ao
adicionar formas sinuosas e consegue fazer dobras, reestruturando
o plano desses agrupamentos.
Na série de fotogravuras, Anita apresenta diversos estudos
estéticos das múltiplas possibilidades de agrupamentos
e composições. A artista nos propõe uma
relação libertadora com a arte a partir da experimentação
plena e transformadora do nosso cotidiano. Ao superar a barreira
do território estético no campo da arte, Anita
almeja atingir uma dimensão maior do espaço,
desconstruindo e reformulando o vazio. Na sua sensível
trajetória artística, Anita percorre um caminho
construído com talento, coerência e uma personalidade
singular. Waldo Bravo
Artista-curador e arte-educador
Vestígios
Quem acompanha o percurso artístico de Margarida Gregori,
se surpreende com o vigor das suas novas representações
pictóricas e com a abrangência da sua narrativa
poética no campo da abstração concreta.
Margarida expõe a expressão dos seus pensamentos,
uma coreografia de representações no território
da linguagem pictórica, que expressam o sublime nas composições,
proporcionando ao espectador uma contemplação e
uma percepção estética única nessas
telas.
É
o resultado da representação mental e da construção
de ideias poéticas de uma fase que teve início
em 2001. Margarida apresenta a síntese da sua trajetória
em trabalhos que exprimem a procura pelo absoluto e pela superação
permanente.
Nesse caminho trilhado pela artista, as indagações
estéticas resultam da incorporação de experiências
distintas na estrutura interna da sua linguagem.
A artista utiliza um processo criativo no qual, ao mesmo tempo
em que nega e apaga camadas e gestos anteriores, ela promove
um resgate sensível desses tempos passados. É como
o trabalho do arqueólogo quando, ao escavar, vai re-descobrindo
obras e criações pré-existentes. Nesta revelação,
emergem fragmentos de representação daquilo não
visível, pensamentos remotos e múltiplas sensações,
na procura incessante dos vestígios da sua memória.
A imagem final reaparece no olhar do espectador como tênue
lembrança existencial num diálogo poético
com o tempo e a memória.
Suas obras permitem variadas leituras no vocabulário artístico
e, ao mesmo tempo, promovem uma ampliação de sentidos
e significados em torno das propostas autorais.
O processo criativo, nas telas de Margarida, amplia o campo físico
da linha e do gesto na medida em que ela utiliza procedimentos
antropofágicos e canibais ao se relacionar com referências
iconográficas históricas ou atuais que ela assimila
e incorpora na sua obra. Uma prática criativa que mistura
história, técnicas e linguagens de forma mais ampla.
Nesse conjunto de trabalhos podemos identificar remetências
e citações pontuais com as obras de artistas como
Antoni Tapies, Sergio Fingerman e Marco Túlio Resende.
Artistas que formam a base estrutural de referências na
sua linguagem e pensamento atual. Ao mesmo tempo, podemos ver
diálogos com as pinturas rupestres e com o grafitte urbano,
inserindo nas telas vestígios e rastros de elementos de
comunicação humana. Nesse contexto também
são inseridas as fendas de Fontana como elo de ligação
com suas fases anteriores.
O experimentalismo poético de Margarida a tem levado a
transitar por linguagens sem dogmas, numa relação
livre e de múltiplas possibilidades estéticas.
A materialidade na superfície das suas pinturas dialoga
com a presença silenciosa das cores, das tonalidades e
dos campos de força constituídos.
Nessa linguagem de abstração concreta, a artista
articula composições de territórios monocromáticos
em contraponto às estruturas irregulares de linhas e gestos
representados no plano pictórico, onde a cor também
se faz presente na superfície das telas, definindo zonas
de plasticidade cromática.
A artista comanda um discurso poético, demonstrando domínio
sobre a técnica apurada e conquistada naturalmente pela
maturidade.
Margarida revela uma rica experiência vivencial representada
em trabalhos equilibrados e sem excessos, desenvolvidos e lapidados
ao longo de sua sensível trajetória de vida e arte.
Waldo Bravo
Artista-curador e arte-educador
Retrospectiva
Judith Lauand no MAM
Aos 88 anos, a “dama do concretismo” brasileiro ganha
uma importante mostra retrospectiva no Museu de Arte Moderna
de São Paulo.
Nascida no interior de São Paulo, em Pontal, ela desenvolveu
a sua carreira artística na cidade de São Paulo,
onde fez parte do Grupo Ruptura junto a importantes artistas
como: Sacilotto, Charoux, Waldemar Cordeiro, Maurício
Nogueira Lima e Fiaminghi.
A única mulher desse grupo revela coragem e ousadia singular
ao lidar com a arte concreta nos anos 50, tempo em que as tradições
e o conservadorismo ainda tinham uma presença marcante.
Sob o nome de “Experiências”, a exposição
reúne mais de 100 obras dos anos 50 aos 70. São
experiências feitas nesse período que incluem pinturas,
desenhos, gravuras e aquarelas selecionadas cuidadosamente pelo
curador Celso Fioravante.
Na herança concreta de Piet Mondrian, Judith brinca nesse
território da abstração, da ração,
da matemática, da rigidez nas composições
geométricas, nas formas e nas linhas.
Trata-se de um recorte temporal da ampla produção
da artista. Um recorte focado na produção mais
relevante da sua trajetória.
A mostra atual constitui-se numa importante referência
histórica da arte brasileira desse período e, ao
mesmo tempo, é uma importante referência para o
entendimento e estudo de boa parte da arte atual, que tem a sua
origem na tradição concreta.
A sua importante trajetória e suas contribuições
artísticas garantem-lhe um lugar de destaque na história
da arte brasileira; o que justifica essa merecida evidência
na atualidade.
Judith Lauand atualmente reside e trabalha em São Paulo.
Waldo Bravo
Artista-curador e arte-educador
29ª Bienal de Arte
O maior evento de artes do continente retoma suas atividades
com vigor e competência, após a profunda frustração
deixada pela “Bienal do Vazio” no cenário
artístico em 2008.
A edição atual, intitulada “Há Sempre
Um Copo de Mar para o Homem Navegar” (Jorge de Lima),
propõe discutir a relação entre Arte
e Política. Ela foi concebida pela dupla de curadores
Agnaldo Farias e Moacir dos Anjos.
A mostra é formada por cerca de 850 obras de 159 artistas.
Embora democrática nos gêneros apresentados,
há uma predominância de fotografias e vídeos.
A produção artística Brasileira está em
destaque, representando um terço da mostra.
Além do espaço para as obras, essa Bienal tem
seis “terreiros”, que são lugares destinados à convivência,
reflexão, criação e descanso do público
visitante. São eles: “O Outro, O Mesmo”, “A
Pele do Invisível”, “Dito, Não
Dito, Interdito”, “Eu Sou a Rua”, “Longe
Daqui Aqui Mesmo” e “Lembrança e Esquecimento”.
Como não podia deixar de acontecer, esta edição
também tem obras polêmicas. É o caso
do artista Gil Vicente, que mostra, em desenhos, ele mesmo
matando algumas personalidades internacionais, incluindo
o presidente Lula.
A questão mais chocante dessa história é o
fato de que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) tenta censurar
essas obras por considerá-las uma incitação à violência. É um
absurdo que se fale em censura. Basta uma recomendação
classificatória de faixas etárias, como acontece
na TV e no cinema.
Entretanto, eu vejo nesses desenhos uma outra questão
polêmica que merece maior atenção do
que a anterior: a utilização de procedimentos
de representação clássica e acadêmica
nessas obras, inseridas dentro de uma Bienal de arte contemporânea,
a qual, teoricamente, pressupõe a busca e o mapeamento
das vanguardas artísticas e dos novos rumos da arte.
Conheço e acompanho com respeito o trabalho de Gil
Vicente há muitos anos. Entretanto, eu vejo nessas
obras apenas um grande poder de sedução por
parte do autor em relação ao tema proposto:
arte e política. Não vejo nelas relevância
contemporânea.
Essa abordagem acadêmica confunde ainda mais a cabeça
do público, que procura entender e desvendar os mistérios
da nossa complexa arte atual. Encontramos mais dúvidas
do que certezas.
A relevância da arte contemporânea não
está nos temas e sim nos processos criativos utilizados
para representar esses temas, ou seja, o que realmente importa
para a arte não é “o que”, mas
sim “como”.
O tema sedutor pode virar uma perigosa barreira e impedir
ao autor de se manifestar como artista.
Polêmica a parte, trata-se de uma Bienal generosa,
democrática e altamente estimulante para quem acompanha
arte atual. Imperdível!!
Waldo Bravo
Artista-curador e arte-educador
38 Salão
de Arte
de Santo André
A 38ª edição do Salão de Arte Contemporânea
de Santo André reafirma, a cada ano, a sua importância
dentro do cenário da arte brasileira. Ele funciona
como um espelho refletindo a produção de
arte da atualidade.
Como Membro da Comissão de Seleção e
Premiação desse Salão, desejo parabenizar
a Prefeitura de Santo André, que, mediante seu Departamento
de Cultura e a sua Comissão Organizadora, demonstrou
o respeito aos habitantes da sua cidade através da
manutenção deste importante salão.
Para podermos analisar e selecionar adequadamente arte
contemporânea é necessário
observar, em primeiro lugar, o contexto atual da arte – onde
temos obras de caráter híbrido, transculturais,
multifacéticas, interdisciplinares, multidisciplinares,
multimídicas, antropofágicas, contaminadas,
multiterritoriais etc. Ou seja, o mix-tudo ou mix-total.
A noção de fronteira entre as diferentes formas
culturais desapareceu ou diluiu-se a tal ponto que é impossível
compreender o estágio atual da arte sem essa consciência, à qual
torna-se obrigatória uma visão contemporânea
múltipla, aliada a um pensamento contemporâneo
múltiplo.
Analisar e selecionar arte representativa nesse contexto
da arte atual não é tarefa fácil. Ainda
mais quando observamos a complexidade do momento na arte
contemporânea somado ao elevado número de inscrições
nesse salão.
Nosso olhar ficou concentrado na procura de obras com
conceitos bem resolvidos, processos criativos bem elaborados,
pesquisa
de linguagens, arte experimental, boas técnicas, criatividade,
poesia visual, riqueza de metáforas, pesquisa de materiais
etc. A idéia é reconhecer o valor do trabalho.
Tivemos que identificar e separar o joio do trigo. Separar
obras relevantes misturadas no meio de trabalhos de principiantes,
modismos de mercado, fórmulas decorativas, arte acadêmica,
plágios, autores ingênuos, mal informados,
etc.
Porém, nem tudo aquilo que é recusado é por
falta de qualidade. O espaço expositivo tem limitações
de montagem, o qual nos obriga a fazer cortes indesejados.
O salão oferece oportunidades democráticas,
onde não se fazem exigências curriculares aos
inscritos. Dessa forma, artistas com trajetória, artistas
emergentes, mestres e alunos têm as mesmas oportunidades.
Os salões, de modo geral, funcionam como laboratórios
de pesquisa para mapear os caminhos contemporâneos
da esgotada arte atual.
Aqui encontramos artistas que dão valor à pesquisa
permanente como procedimento de trabalho, porque eles têm
consciência de que através dessa pesquisa
a arte se atualiza, se recicla, se sintoniza no tempo
e permite-lhes
exercitar diariamente o contato com a liberdade.
Alguns artistas selecionados nesta edição revelam
fortes indícios de um futuro promissor. Vamos aguardar… O
tempo irá dizer. Waldo Bravo
Artista-curador e arte-educador
Sonha-me tua
Bia Black vive um intenso momento de reflexão interior,
de autoconhecimento e depuração do seu processo
criativo.
No presente, Hilda Hilst está no centro dos seus questionamentos,
transformada no seu espelho, espelho de vida. A obra de Bia nutre-se
dessa relação ao retirar boa parte da energia vital
que estimulam suas criações… “Viver, é desenhar
sem borracha”.
A polêmica escritora Hilda Hilst (1930 – 2004) expunha
livremente seus ideais e pensamentos, tratando de forma nua e
crua temas como o erotismo e a pornografia. Entretanto, percebe-se
que esses temas são tratados apenas como meios para falar
de coisas mais transcendentais tais como Deus, sentimentos, especialmente
sobre o amor e sobre a vida que subsiste através do amor.
Ela questiona os mistérios da vida, fala de pessoas, do
complexo mundo em que vivemos e do existencialismo. Em síntese,
fala da complexidade da alma humana e de seus relacionamentos.
No seu processo criativo, Bia se apropria de frases ou palavras
de Hilda, com as quais se identifica, que refletem o que sente
naquele momento, para logo inseri-las no seu trabalho.
As palavras surgem na tela como gestos pictóricos, às
vezes de forma nítida, e outras vezes semi-encobertas
por outras camadas de tinta, num provocativo jogo de apagamento
e sedução construído a partir dessas sobreposições.
As obras de Bia são o resultado de uma longa relação
com a pintura. Desde seu início, a cor sempre esteve no
centro das suas pesquisas de uma forma muito intensa, e nesse
atual momento de síntese, a cor adquire valor e importância
ainda maior.
Suas obras são constituídas por territórios
coloridos, construindo planos e sensações de profundidade
a partir das transparências cromáticas.
Em alguns momentos, seus territórios ou campos coloridos
recebem a influência de Mark Rothko, do expressionismo
abstrato, um dos artistas mais importantes do século XX.
Em outros momentos, ao elaborar seus conteúdos fragmentados
a partir das bordas e laterais da tela, surgem diálogos
pontuais com a obra de Frank Stela, o eclético artista
contemporâneo dos Estados Unidos.
As pinceladas vigorosas registram toda a gestualidade do seu
processo criativo nesse momento. São gestos expressivos
de grande fluidez expressados mediante cor, às vezes em
obras quase monocromáticas.
Bia constrói tensões cromáticas e territoriais
entre os espaços saturados em contraponto aos espaços
vazios, o que constitui fator determinante no valor expressivo
das cores e das tonalidades definidas na sua relação
lado a lado.
Num rico jogo de instabilidade e desequilíbrio, Bia brinca
com a luz, com a sombra, com a cor e o com espaço, criando
campos de variados formatos e relações cromáticas,
geradas mediante sobreposição de camadas pictóricas.
Nesse território bi-dimensional, a artista se expressa
com muita personalidade, revelando seu amplo domínio,
tanto na cor quanto no gesto, transitando ambiguamente entre
o território emocional e o racional.
As pinturas de Bia vão muito além das relações
cromáticas e construtivas que caracterizam seu presente
momento. Ela mergulha fundo no território sensível
da sua espiritualidade, traduzindo intensamente toda a sua maturidade.
Waldo Bravo
Artista-curador e arte-educador
Trans-formação:
a
linguagem poética
do movimento
Quando recebi o convite para orientar e acompanhar o processo
criativo da artista Fabí Mello, vi na ocasião
uma rica oportunidade para investigar os caminhos contemporâneos
da arte cinética.
Quando falamos em arte cinética, estamos falando da
arte que incorpora a idéia de movimento, não
como uma obra de arte que representa o movimento e sim como
uma obra que contém movimento ou está em movimento,
transformando-se em um objeto móvel.
Conceitualmente, o princípio de estruturação
da arte cinética está diretamente ligado ao movimento,
opondo-se à condição estática da
arte tradicional, como é o caso da pintura e da escultura.
Esse campo da arte é constituído de trabalhos
que exploram as possibilidades de transformação
visual, de forma óptica ou física, evidenciados
por atitudes posicionais do observador ou a partir de uma ação
manipuladora.
A exposição “Le mouvement”, de 1955, é considerada
como a primeira Mostra de Arte Cinética da história,
realizada na galeria Denise René, de Paris.
Nesse domínio, destacam-se artistas como Marcel Duchamp,
Alexander Calder, Vasarely, Jesus Soto, Yaacov Agam, Jean Tinguely
e Pol Bury, entre outros. Alguns historiadores tendem a incluir
no território cinético obras da Op-Art (arte óptica),
tais como Julio Le Parc, Luis Tomasello e Carlos Cruz-Diez.
Aqui no Brasil, o pioneiro nessa linguagem foi o artista
Abraham Palatnik. No ano 1999, o Itaú cultural realizou uma
importante mostra de arte cinética denominada “Técnica – Cotidiano
/ Arte”, na qual se procurou fazer um mapeamento histórico
desse movimento no Brasil. Nessa exposição estavam
presentes obras de Palatnik junto a obras de outros importantes
artistas, como Carlos Fajardo, Guto Lacaz, João Wesley,
Marcelo Niesche, Márcia X, Pedro Paulo Domingues, Sérvulo
Esmeraldo, Waldemar Cordeiro, entre outros.
Nos últimos anos, Fabí Mello tem pesquisado as
diversas possibilidades de representação de campos
cromáticos junto aos procedimentos de transformação
de imagens.
A obra do expressionista abstrato Mark Rothko – um dos
artistas mais importantes do século XX – surge
nas suas pesquisas como um poderoso estímulo.
Fabí se apropria dos famosos campos de cores de Rothko
para fazer leituras próprias. Nesse momento, a artista
exercita uma antropofagia criativa: a arte se alimentando da
própria arte, a representação tendo como
base outra representação.
As apropriações nos moldes Duchampianos, tais
como Fabí as realiza, são uma vertente explorada
por diversos artistas na pós-modernidade.
Fabí Mello estabelece um diálogo com Mark Rothko,
utilizando a sua obra para explorar as possibilidades visuais
do movimento e experimentar as suas transformações
cinéticas. O foco da artista está na forma, no
processo de transformação e reconstrução
poética dos campos de cores que se “autoconstroem” e
logo se “autodestroem”.
O fio condutor no seu atual processo criativo é a idéia
de metamorfose. Para Fabí Mello, “a vida é flexibilidade,
transformação e movimento”.
A artista utiliza estruturas cinéticas que se transformam,
que se movem e surpreendem, produzindo ricos efeitos mutáveis
fundamentados nas alterações perceptivas, construídas
a partir da variação da posição
do observador diante da obra e da ação da luz
na sua superfície.
As experiências e pesquisas cinéticas de Fabí Mello
incluem os happenings, entrando no território da arte
sensorial auditiva e tátil com obras lúdicas
e jogos interativos.
Fabí Mello questiona o que é real, brinca com
a impermanência dos estados da matéria através
de obras consistentes, construídas mediante uma expressiva
poesia visual.
Ela é uma artista multidisciplinar que utiliza diversos
meios e suportes. Ao mesmo tempo revela grande capacidade de
planejar e dominar seu processo criativo nesse estimulante
território da poética do movimento.
Ao observador, cabe contemplar o movimento das assemblages
cinéticas que parecem estar vivas e o movimento das
recriações em vídeo, nos quais ela acrescenta
elementos em movimento real nos campos bidimencionais do Rothko,
colocando-os em outra dimensão.
Criadora de novos alfabetos, Fabí Mello trabalha com
determinação e coragem, produzindo obras rítmicas
nesse singular território, conseguindo, dessa forma,
resultados que provocam curiosidade, mistério e surpresa. Waldo Bravo
Artista-curador e arte-educador
Sinfonia
cromática de
Vicencia Gonsales
Vivemos num tempo de intensa contaminação visual,
provenientes de imagens da televisão, internet, cinema,
propaganda exterior, mídia impressa, etc. etc.
Trata-se de um bombardeio de imagens sem precedente na história
da humanidade, que está transformando a nossa visão
e a deixando adormecida. Centenas de milhares de imagens passam
velozmente frente a nossos olhos diariamente. Quase não
temos tempo para a contemplação de uma pintura,
a qual exige uma atitude mais demorada, uma apreciação
sutil e sensível ao mesmo tempo.
Na grande maioria dos eventos de arte contemporânea há pouco
espaço para obras bidimensionais, com exceção à fotografia.
Nesse atual contexto, embora predomine a sedução
dos novos meios, ainda é possível afirmar: a pintura
continua viva!
Temos ótimos pintores na atualidade espalhados pelo mundo,
embora poucos com relevância e qualidade. Aqui no Brasil
podemos destacar: Paulo Pasta, Adriana Varejão, Emmanuel
Nassar, Beatriz Milhases, Daniel Senise entre outros.
O território da pintura é altamente explorado,
portanto não é nada fácil acrescentar algo
novo. Entretanto, de tempos em tempos, surgem instigantes revelações
como é o caso da artista Vicencia Gonsales.
O atual conjunto de trabalhos de Vicencia foi desenvolvido gradativamente
a partir das suas fases anteriores, onde experimentou a figuração
informal, e posteriormente, nas suas pesquisas, explorou as possibilidades
das monotipias e dos desenhos extraídos de suas superfícies.
Nesse processo de sólida raiz, a artista extraiu o desenho
da pintura. Separadamente, esse desenho foi aprimorado enquanto
linguagem e logo inserido novamente na pintura, de forma equilibrada
e em perfeita harmonia.
As obras de Vicencia transitam entre a pintura, a colagem e o
desenho. Ela pinta desenhando e dialogando com tecidos estampados,
integrando-os na superfície da tela, recriando e prolongando
o conteúdo dessas estampas mediante pintura e desenho.
A artista utiliza um processo criativo que incorpora o múltiplo
e o heterogêneo. É uma expansão da pintura
ao tratar da colagem, do desenho, da costura e da adição
de metais na superfície da tela. Tudo isso traz mudanças
radicais ao seu modo de pintar.
Nesse processo, é possível identificar alguns elementos
que compõem seu repertório: por um lado, os provenientes
das estampas e dos tecidos colados, tais como flores, fazem referências
a pop-art e ao tropicalismo. Por outro lado, podemos identificar
os elementos provenientes da ação criativa da artista,
expressada mediante linhas e rendas gráficas intuitivas
e arabescos, que referenciam o movimento art déco, o carnaval
e os diálogos pontuais com a obra de Beatriz Milhases.
Em conjunto, todos esses elementos que caracterizam sua atual
produção remetem a questões relativas à abstração
concreta e neoconcreta.
A técnica mista utilizada tem por base a colagem, através
da qual a artista alcança uma rica diversidade, criando
um vocabulário de impacto pictórico e confrontos
entre o desenho e a colagem, conseguindo um resultado pessoal
e corajoso, fruto dessa harmonia de excessos.
De certa forma, ao se apropriar dos desenhos já contidos
nesses tecidos estampados, conceitualmente Vicencia revela heranças “Duchampianas” nessas
colagens. Surge aí um diálogo entre o desenho impresso
e o desenho representado. Ou seja, uma representação
dialogando com outra representação, e não
com o mundo real. Surge aqui a utilização da metalinguagem
ao introduzir uma estampa pronta na pintura e não uma
estampa representada.
Na obra de Vicencia, a questão do desenho e da linha é um
elemento estrutural predominante, é seu território
simbólico, em que se manifesta toda a sua personalidade.
Essas linhas dialogam com os tecidos estampados e com os espaços
cromáticos, outorgando a esses elementos que compõem
a pintura, pesos e valores visuais diferenciados.
São essas linhas emaranhadas de teor orgânico que
modificam a percepção da pintura saturada da artista,
as quais conduzem nosso olhar pela superfície da pintura
ao transitar entre diversos territórios e fronteiras dissolvidas
pela intervenção integradora do desenho, inserindo
profundidade na tela e aumentando a força dos seus campos
cromáticos.
A frescura e a complexidade das suas composições
no processo pictórico dão inicio à formulação
das próprias teorias visuais da artista, levando-nos a
um imaginário singular, de pinturas assumidamente belas
e muito expressivas, que retém o nosso olhar.
Embora nas pinturas de Vicencia vejamos uma aparente ambiguidade
entre o território emocional e o racional, plasticamente
o que acaba prevalecendo de modo geral no campo da representação,
são as composições líricas emotivas,
nas quais os procedimentos híbridos estão ganhando
espaço e corpo na atualidade.
A pintura de Vicencia não tem nada de dócil. Ao
contrário, é selvagem ao extremo. E é justamente
essa característica que torna sua obra atraente ao nosso
olhar.
Nesse momento experimental do desenho, surgiram outras vertentes
e possibilidades em torno do espaço e da arquitetura.
Nas suas obras de intervenção arquitetônica,
ela coloca em discussão as fronteiras da pintura e o lugar
da arte a partir do momento em que extrapola os limites tradicionais
do suporte da tela, prolongando seu desenho para as paredes,
que acabam sendo incorporadas à sua obra na forma de suporte,
transformando-se no campo de representação das
suas ideias.
Aqui se discutem questões muito pertinentes à arte
contemporânea: a expansão territorial, a limitação
dos suportes tradicionais, a efemeridade da obra, a ação
e a intervenção da artista no espaço real
da arquitetura.
Nesse momento, Vicencia abre mão de algo precioso para
muitos pintores: a autonomia da arte. Trata-se de um mergulho
no território das instalações, as quais
utilizam o espaço arquitetônico como suporte, passando
a depender dele.
Em síntese, são pinturas altamente sedutoras, que
chamam atenção por levar nosso olhar diretamente à intenção
da artista: a procura constante da liberdade.
O ineditismo das obras da artista a colocam junto a um seleto
grupo de pintores que deram novas soluções ao dilema
conceitual da representação. Nesse momento, vemos
toda a afirmação autoral na superfície da
tela, destacando assim, sua ação fundamental como
pintora.
O atual momento pictórico de Vicencia Gonsales constitui
sua melhor fase do seu percurso histórico. Vale a pena
não perder de vista os novos caminhos a percorrer pela
artista no campo da pintura!
“
Caminante no hay camino, se hace camino al andar”.
Waldo Bravo
Artista-curador e arte-educador
Veja
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